terça-feira, 19 de maio de 2015

Vertigo: Pré-Vertigo Parte 3
A história que antecede o selo: 1988

Regressamos aos anos que marcaram o surgimento de novos formatos e novas maneiras de contar histórias na DC Comics, a caminho da Vertigo. O número de revistas para leitores mais experientes cresceu exponencialmente, pelo que agora cada ano será tratado separadamente.

Em 1988, a DC já editava regularmente uma pequena quantidade de títulos dedicados a histórias com temáticas mais adultas e mais intimistas, cada vez mais afastadas das tradicionais histórias de super-heróis e de aventura. A lista de revistas mensais incluía Swamp Thing, The Shadow, The Question e a antologia Wasteland. Também já tinha começado um novo volume de Doom Patrol, mas a revista ainda contava com o selo da Comics Code Authority e a Patrulha do Destino agia como uma vulgar equipa de super-heróis. O título de espionagem Suicide Squad também já tinha começado (e teria um spin-off, Checkmate!, durante 1988), mas as histórias passavam-se firmemente no Universo DC, com histórias cruzadas com a Liga da Justiça. O mesmo se passava com o título do detective sobrenatural Espectro, The Spectre, do qual faziam parte do elenco Madame Xanadu e alguns antagonistas da série I… Vampire.

Esse número aumentou em Janeiro com a chegada de Hellblazer, estrelando uma personagem secundária das histórias do Monstro do Pântano, o amoral feiticeiro britânico John Constantine, ex-punk rocker, anti-social e fumador compulsivo. Criado por Alan Moore, Constantine tinha surgido nas histórias do Monstro do Pântano, mas o escritor não trabalhou com ele no novo título. Hellblazer ficou conhecido por lidar com vários temas sociais, com as características de terror das histórias mais subtis, além de ficar completamente afastado do Universo DC. Jamie Delano foi o primeiro escritor, antes de passar as rédeas para Garth Ennis, no que foi o primeiro trabalho americano de ambos. Já dentro da Vertigo, Paul Jenkins e Warren Ellis também escreveram histórias.

Hellblazer foi o último título sobrevivente da linha original da Vertigo, continuando a ser publicado até 2013, encerrando com o número 300, a partir do qual John Constantine regressou finalmente ao universo DC. Apesar da personalidade mais britânica do livro, o americano Brian Azzarello também escreveu o título, antes de passar para a pasta para uma nova série de autores britânicos (Denise Mina, Andy Diggle e finalmente Peter Milligan).

Em Fevereiro chegou a série mensal Green Arrow. Prosseguindo a partir dos eventos da mini-série, a primeira série mensal do Arqueiro Verde transformou Oliver Queen num vigilante urbano, lidando contra o crime organizado e políticos corruptos na cidade de Seattle. Dinah Lance e a ninja Shado passaram a fazer parte do elenco, mas quase sem mencionar super-poderes (paralelamente, Dinah continuava a operar como Canário Negro nas histórias da Liga da Justiça), e o contacto com o resto do Universo DC foi praticamente cortado. A revista continuou a fazer parte da linha para leitores maduros até ao número 62, quando Queen voltou a comportar-se mais como um super-herói, mas o escritor Mike Grell continuou no título até à edição 80, precisamente um mês antes da Vertigo começar.

Fevereiro foi também o mês de lançamento da mini-série em formato de luxo Blackhawk. O herói aviador da Segunda Guerra Mundial, adquirido pela DC à Quality Comics após a falência desta em 1957, viu a sua origem completamente revista, com Howard Chaykin a emprestar mais realismo ao título durante as três edições, com mais detalhes sobre os aviões, mais motivações políticas por trás das acções do herói principal (transformado num polaco naturalizado americano) e maior cuidado com as personalidades dos outros membros do esquadrão aéreo, especialmente Lady Blackhawk e o chinês Chop-Chop (anteriormente uma caricatura racista).

Alan Moore regressou às bancas em Junho com a edição especial Batman: The Killing Joke. Embora Batman nunca tenha sido considerado material Vertigo, o surgimento de novos formatos de publicação nos anos 80 ajudou à publicação de material mais adulto, e a natureza noctívaga do vigilante tornou-o apelativo para histórias com mais consequências. The Killing Joke, desenhada por Brian Bolland, é um exemplo disso, dada a fama da história onde o Joker é elevado ao nível de um verdadeiro psicopata, paralisando Barbara Gordon com um tiro na coluna e torturando o comissário Gordon. Mais edições especiais e mini-séries se seguiram onde o crime e o terror eram ingredientes normais.

Poucos meses depois, em Setembro, foi a vez de V for Vendetta, em parceria com David Lloyd. A série tinha começado na antologia britânica Warrior em 1982, mas foi interrompida com o fecho desta. A DC adquiriu o título e Moore e Lloyd recombinaram o material existente, levando depois a história até à sua conclusão natural em dez números. V for Vendetta é, tal como Watchmen, uma das obras-primas da DC, explorando um futuro (ou presente) alternativo onde conflito nuclear tinha devastado o planeta e apenas uma Inglaterra fascista sobrevivia, para ver depois a sociedade ser destruída, tanto formal como filosoficamente, por uma figura mascarada de inspiração anarquista. Ao contrário de Watchmen, futuras reimpressões de V for Vendetta passaram a ter o selo da Vertigo na capa. A sua transformação em filme tornou-a bastante mais relevante como um ícone cultural nos últimos anos, ainda que Moore tenha ficado muito pouco satisfeito com as características mais populistas da adaptação.

Setembro foi também o mês do lançamento da revista Animal Man. Outrora um super-herói obscuro de segunda linha, Grant Morrison, acompanhado por Chas Truog, transformou o Homem-Animal numa figura mais humana, ao mesmo tempo que explorou temas psicadélicos, ecologia, a natureza dos superpoderes e até metanarrativa, tentando derrubar a fronteira entre os criadores, as suas personagens e os leitores, um tema que viria a explorar várias vezes no futuro. Morrison escreveu o título durante 26 números, antes de entregar a revista a Peter Milligan e depois a Jamie Delano, que introduziram temas de shamanismo e magia totémica na série. A revista fez parte do lançamento inicial da Vertigo, mas já tinha passado a ser recomendada para leitores adultos alguns anos antes. Apesar de ter sido publicada muito antes da sua integração na Vertigo, a passagem de Morrison por Animal Man é considerada a mais importante do título.

Várias mini-séries mais viradas para adultos foram publicadas durante 1988. A mais conhecida é talvez Cinder and Ashe, uma mini-série em quatro edições que começou em Maio. Criada por Gerry Conway e José Luis García-López, é uma história hard boiled the detectives, um estilo e um tema que Conway viria a explorar mais nos anos seguintes, quando saiu da indústria de BD para a televisão. Cinder and Ashe foi reimpresso recentemente, depois de décadas fora da vista dos leitores, mas não na Vertigo, pois apesar de ter temática apropriada, o visual é demasiado tradicional. Tailgunner Jo, de Peter B. Gillis e Tomosina Artis, começou em Setembro e durou seis números, uma história de ficção científica de guerra passada no futuro, onde um desastre natural alterou completamente a geografia do planeta. Ficou na lista dos 'desaparecidos em combate' como tantas outras. O mesmo não se pode dizer de Unknown Soldier, mini-série em 12 números lançada em Dezembro. Escrita por Jim Owsley e desenhada por Phil Gascoine, foi a primeira história pós-crise do Soldado Desconhecido, transformado num agente especial bem mais cínico e menos patriota do que o modo como era representado nas antologias de guerra. Embora não tenha sido reimpressa, serviu como elo de ligação para o uso do personagem por Garth Ennis já na Vertigo, em 1997, de um modo igualmente cínico e sombrio.

Com histórias mais adultas que as tramas normais do Universo DC, a revista mensal Haywire (lançada em Outubro), que durou 13 números, e as mini-séries The Weird, de Jim Starlin e Bernie Wrightson (Abril), Deadshot (Novembro) e Peacemaker (Janeiro), todas de quatro números, encaixavam perfeitamente no espírito da Vertigo, mas estavam presas na cronologia. Deadshot, com o vilão tornado anti-herói Floyd Lawton (mais conhecido como Pistoleiro), era, aliás, um spin off do Esquadrão Suicida, enquanto Peacemaker (em português, o Pacificador), tentava ter o mesmo sucesso na DC de que gozavam outros personagens comprados à editora Charlton, nomeadamente o Besouro Azul e o Capitão Átomo, que à época integravam a Liga da Justiça.

Depois do sucesso da mini-série, Clark Savage Jr. seguiu o mesmo caminho do seu correligionário da Street & Smith, o Sombra, e ganhou uma série mensal. Começando em Novembro, Doc Savage, escrita por Denny O'Neil e utilizando capas pintadas evocativas das revistas pulp, trouxe o herói dos anos 30 e 40 para o presente, lutando contra novas ameaças ao lado do seu neto, também chamado Clark. Apesar do ambiente moderno, era mais fiel ao espírito original do 'Homem de Bronze' que as surreais histórias do Sombra. Durou 24 números e um anual. Outro herói adaptado foi publicado pela DC a partir de Outubro de 1988, o Prisioneiro. Sequela da série de televisão da ITV dos anos 60, The Prisoner: Shattered Visage foi uma mini-série em quatro edições em formato prestige. Escrita e desenhada por Dean Motter, passava-se 20 anos depois, na aldeia onde o Prisioneiro Número 6 ainda estava vivo. Tinha um visual bem mais parecido ao que viria a tornar-se a Vertigo e foi reimpressa em 1990, mas nunca chegou a integrar o selo.


Houve também espaço em Dezembro para duas novas séries, Dragonlance e Advanced Dungeons and Dragons, inspiradas nos respectivos RPG produzidos pela TSR, no mesmo formato das histórias mais adultas, mas a série de fantasia apelava a um público mais especializado. Nos anos seguintes, a linha TSR foi expandida com mais títulos, Gammarauders, Forgotten Realms, Spelljammer, Avatar a antologia TSR Worlds. A TSR Comics foi cancelada em Novembro de 1991.






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