Hoje começamos com uma série de artigos que propõe recordar o percurso editorial que levou a DC Comics a criar a Vertigo, tendo em conta as origens e a história do selo de material adulto, que começaram em 1982, quando o mercado directo permitiu às editoras lançar material sem o selo da Comics Code Authority.
Tanto a Marvel como a DC Comics tinham linhas de títulos
bastante diversificadas nos anos 70, incluindo humor, fantasia, guerra e terror
além dos super-heróis. No entanto, aqueles géneros eram também os mais
vulneráveis a flutuações de um mercado onde a BD ficou bastante vulnerável à
guerra das distribuidoras nas bancas, contribuindo para a criação do mercado
directo. E foi quando surgiu este espaço que as editoras começaram a tornar-se
mais criativas, reforçando a sua imagem de editoras de super-heróis ao mesmo
tempo que tentavam melhorar a qualidade das histórias de outros géneros,
atraindo novos talentos ou dando mais liberdade criativa a certos artistas
consagrados para sair dos padrões formulistas dos anos 70.
Em 1982, a Marvel lançou uma linha inteira de revistas como
um spin-off da revista Epic Illustrated (tentativa de emular a Métal
Hurlant e a sua variante americana, a Heavy Metal), a Epic Comics,
onde, regra geral, o material produzido era propriedade intelectual dos seus
criadores. A DC, por seu lado, preferiu lançar séries novas com a marca da DC,
mas sem o selo da Comics Code Authority e papel de melhor qualidade. Nesse ano,
a subsidiária da Warner Communications deu os primeiros passos na criação de
uma linha editorial que mais tarde daria origem à sub-editora Vertigo.
Vários títulos no activo integrariam a Vertigo no futuro.
Entre eles estavam Saga of the Swamp Thing (a primeira revista solo do
Monstro do Pântano) e Unknown Soldier (O Soldado Desconhecido), bem como
as antologias House of Mystery e Weird War Tales. Outras revistas
tinham material que andava nas fronteiras entre a DC e o futuro selo, como a
revista do herói aviador Blackhawk, o grupo de investigação oculta Night
Force, os títulos de fantasia Arion, Lord of Atlantis e Arak, Son of Thunder
e a revista de ficção científica (género 'sword and planet') Warlord.
O primeiro título da DC criado especificamente para o mercado directo foi a mini-série Camelot 3000 (teoricamente, a primeira revista deste género foi o one-shot de Madame Xanadu de 1981), de Mike Barr e Brian Bolland, cujo número 1 chegou às bancas em Dezembro de 1982. A história cola elementos de ficção científica (cenário no futuro da Terra, invasão alienígena) com o mito do Rei Artur, e a sua distribuição limitada permitiu a Barr explorar temas como romances homossexuais e transsexuais, relações inter-raciais e comparações entre o mito arturiano e cultura extra-europeia. Bolland teve vários atrasos e a mini-série de 12 números terminou apenas em 1985, mas esta história demonstrou a viabilidade de projectos fechados e de séries fora da continuidade e com um pouco mais de sofisticação.
Camelot 3000 também foi uma das primeiras séries da DC
a ficar disponível como uma graphic novel em formato TPB, a partir de 1988. Nunca
foi integrada na linha Vertigo, apesar de ter uma temática apropriada para o
que a linha se tornou, mas não o que era no seu lançamento.
Em 1983, a revista ganhou companhia entre os títulos com temáticas adultas. Novembro viu o lançamento da série Thriller. Concebida como um título mensal, começou com argumento de Robert Loren Fleming e arte de Trevor Van Eeden e terminou no 12º número, na fase final já com argumento de Bill Dubay e arte de Alex Niño. A história era essencialmente de ficção científica, com um grupo paramilitar que se encarregava de derrotar ameaças terroristas e quase sobrenaturais. Nunca foi reimpresso e hoje é pouco conhecido, ao contrário da revista Ronin, lançada em Julho.
Com argumento e arte do mais conhecido Frank Miller, na altura um ídolo das multidões pelo seu trabalho nas histórias do herói Demolidor, da Marvel, Ronin devia ter sido lançada como parte da linha inicial da Epic Comics. No entanto, num almoço com a presidente da DC, Jenette Kahn, foi persuadido a mudar de camisola. Kahn prometeu-lhe a manutenção dos direitos de autor, se bem que na prática a DC controla a publicação de material da propriedade. Miller criou uma história sobre um samurai ressuscitado num futuro distópico nos Estados Unidos, para enfrentar o seu némesis, fazendo equipa com uma agente de segurança. Cada uma das seis partes da história tinha 48 páginas e Miller não se coibiu de copiar directamente painéis desenhados por Goseki Kojima na série japonesa Lone Wolf & Cub, da qual o autor americano era grande fã.
Um escritor britânico ainda pouco conhecido, chamado Alan Moore, foi encarregado de começar a escrever Saga of the Swamp Thing, a revista do Monstro do Pântano, e a primeira coisa que fez foi matar o personagem principal, no nº 20, publicado em Janeiro de 1984. Isto libertou Moore do personagem unidemensional e permitiu-lhe explorar elementos como a relação dos seres humanos com o planeta, sexo inter-espécies ou a Teoria de Gaia e também serviu para criar o tipo de ambiente que seria a componente central da Vertigo em 1993. Moore continuou a escrever o Monstro do Pântano até ao nº 64, em 1988. A nova direcção nunca foi um grande sucesso de vendas, mas foi bastante apreciada pela crítica e cimentou a popularidade de Moore junto de um público mais sofisticado.
Durante o período de 1984 a 1985, a DC também lançou mais alguns títulos noutros géneros, que estariam próximos da temática Vertigo. O primeiro foi Nathaniel Dusk, a história de um detective privado nos anos 30, durante a Grande Depressão, um tema supostamente gasto mesmo nos anos 80, mas soberbamente executado pela dupla Don McGregor/Gene Colan, que trabalharam juntos muitas vezes. A mini-série de quatro números em formato de luxo, lançada em Fevereiro, centrou-se essencialmente nas experiências individuais dos personagens e teve direito a uma sequela em Outubro de 1985. Ainda em 1985, em Setembro, a DC fez uma modificação total ao personagem western Jonah Hex, transformando o ex-soldado da Confederação num motoqueiro num mundo pós-apocalíptico do futuro. A revista, baptizada simplesmente Hex, durou 18 números, mas quando Jonah Hex voltou integrado na Vertigo, foi de volta ao seu ambiente normal.
A DC experimentou também com ficção científica mais clássica, com as mini-séries Spanner's Galaxy e Sun Devils. A primeira, lançada em seis números a partir de Dezembro de 1984, era uma space opera criada por Nick Cuti e Tom Mandrake, e a segunda, lançada em 1984 e durando doze números, era uma história de invasão alienígena feita por Gerry Conway e Dan Jurgens, passada num ambiente militar. Sun Devils não teve o selo da Comics Code Authority, o que a poderia tornar interessante para ser republicada na Vertigo.
Durante 1985, passaram ainda pelas bancas revistas do Deadman e do Dr. Fate, republicando histórias passadas. Ambos os personagens permaneceram paralelos à Vertigo, mas nunca foram formalmente absorvidos. A história do Manhunter de Archie Goodwin e de Walt Simonson, retirada das últimas páginas de Detective Comics, também foi republicada numa edição especial. Começando em 1984, a DC também editou uma antologia para novos talentos, New Talent Showcase, englobando vários temas, desde os super-heróis ao terror, passando pela fantasia e pela ficção científica, mas não deu origem a novos personagens e a revista foi sempre obscura.
Continua na próxima semana com o período referente a 1986 e 1987.
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