quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Unflattening



"Philosophy begins in wonder."
Alfred North Whitehead

A Banda Desenhada continua a surpreender-me. Acaba sempre por cair nas minhas mãos de tempos a tempos alguma obra que sai fora da caixa.
Desta vez foi este incrível Unflattening de Nick Sousanis.

Sousanis é professor universitário, crítico de arte e desenhador. Antes disso, era professor de ténis!
Em 2008 vai para Nova Iorque em busca de um grau de Doutor na disciplina de Education in Interdisciplinary Studies na Columbia University's Teachers College. E é aqui que começa a nascer esta obra.

Em 2014 defende a sua tese em forma de Banda desenhada, sendo a primeira vez que tal aconteceu. Um verdadeiro tratado filosófico, sensorial, impregnado de metáforas e referências com as quais o leitor navega e é obrigado a abrir a mente. Bem vindos a Unflattening!

Sousanis divide este seu livro em oito capítulos onde o leitor entra numa jornada epistemológica que se inicia com alguns conceitos que nos vão acompanhar durante todo o livro, o pensamento tridimensional, bidimensional e linear. Como nós somos formatados na maneira de vermos o mundo, as fronteiras impostas ao pensamento e ao conhecimento, pela educação de que somos alvo desde que nascemos.

E claro, passamos para a Flatland, clara referência ao livro de Edwin Abbot que conta o encontro entre uma figura bidimensional (Quadrado) e um tridimensional (Esfera). A Esfera mostra ao Quadrado todo um mundo de possibilidade, perspectivas e pontos de vista diferentes!

Aliás, este é o fulcro do livro, a procura do maior número possível de maneiras diferentes de ver a mesma coisa, e tudo isto é feito numa simbiose perfeita entre a palavra e o desenho. Assim como a escrita nos leva por caminhos diferentes, a construção das páginas faz exactamente o mesmo. Não temos uma regra definida nem de representação gráfica, que pode ir do desenho mais elaborado ao mais linear, como a própria condução na estrutura gráfica da página nos pode levar naturalmente da esquerda para a direita, da direita para a esquerda, diagonais do canto direito para o esquerdo voltado a subir um pouco para o lado contrário. Parece complicado? Não é. Sousanis faz com que o leitor navegue graficamente em completa comunhão com o texto, sem barreiras, sem esforço.

























As referências são deliciosas, desde a cabine telefónica onde Clark Kent  se "transforma" (ou será o contrário) em Superman e de repente estamos no interior dessa mesma cabine telefónica mas já no ambiente do Dr Who.  Desde os desenhos rupestres da Pré-História à visão do mundo de Copérnico, e porque não falar das sandálias aladas de Hermes que nos levem para perspectivas do mundo que nunca conseguiríamos ter com os pés ao nível da terra?

Este livro constrói todo um mundo de possibilidades.

Alguns apontamentos que mexeram comigo. No interlúdio Strings Attached onde pontifica um marioneta (tipo Pinóquio), temos um pequena história de uma página que se repete até à exaustão (claro que isso é subentendido, representando a nossa rotina bidimensional).  Um dia em determinada altura a nossa personagem tem uma muito pequena alteração numa pequena vinheta. Repara numa lagarta, maravilhosa analogia porque essa pequena diferença transforma toda a rotina e observação do mundo pela marioneta, acabando por ter um efeito borboleta.
A lagarta tinha uma fome monstra crescendo todos os dias (alusão a The Very Hungry Caterpillar de Eric Carl). A estrutura da página vai-se tornando mais "caótica" conforme a toda a rotina é quebrada, acabando com toda a estrutura estabelecida para trás, acabando com um enorme "Who are you?" que é a 1ª frase (pergunta) da lagarta no livro "Alice no País das Maravilhas", e para logo de seguida se pendurar para a metamorfose colocando-se na posição de ponto de interrogação usado pelas lagartas da borboleta Monarca. "Quem sou eu?" é uma pergunta difícil para quase todos os seres Humanos, muitas vezes não gostamos da resposta...

Um pouco mais à frente temos a mesma marioneta cortando os seus fios. Libertação? NÃO!

"To set ourselves free, we can´t simply cut our bonds. For to remove them (if we could) would only set us adrift, detacheded from the very things that make us who we are.
The strings stay on. By identifying more threads of association, we are better able to see these attachments not as constraints but as forces to harness.
Nick Sousanis

"Emancipation does not mean 'freed from bonds' but well-attached."
Bruno Latour

Todo este texto acompanhado de imagens bastante fortes/expressivas. Nota máxima.

Este é um livro que mexe connosco se o lermos de mente aberta. Uma junção perfeita da palavra com a imagem (acessível para todos).

O LBD recomenda fortemente este livro, e já agora, se algum editor por acaso ler este meu post, por favor, pese a possibilidade de o editar em português.


Boas leituras

Softcover
Criado por Nick Sousanis
Editado em 2015 pela Harvard University Press




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