quarta-feira, 6 de julho de 2022

Eu, Assassino


Chamam-lhe a Trilogia Egoísta, ou Trilogia do "Eu", uma série reflexiva em três relatos de "falhas" Humanas: Eu, Assassino, Eu, Louco e Eu, Mentiroso. Obra de António Altarriba  e Keko.

Foram todos publicados em português o primeiro pela Arte de Autor e os dois seguintes pela Ala dos Livros.

Hoje o LBD vai olhar para o primeiro volume Eu, Assassino publicado pela editora Arte de Autor.

"Matar não é um crime, matar é uma arte."
- Enrique Rodriguez

É assim que começa o livro, e começa com um assassinato rápido e brutal ,em plena rua durante o dia.
Esta obra é complexa. Os temas abordados, para além do óbvio (assassinatos) são tratados com mais ou menos profundidade dentro de um quotidiano negro com problemas políticos, adultérios, solidão física e emocional, traição, enfim, todas estas vertentes de um diário escuro são peças do xadrez pensado por Altarriba e pintado por Keko num excelente Preto & Vermelho.

Henrique é um professor universitário de Arte, ao mesmo tempo é também um crítico conceituado de um género de pintura, em que o sofrimento é base emocional dessa mesma obra. Em determinado momento da sua vida de solidão a dois, acaba por transpor para a vida real a arte dessas pinturas.

Não se considera um serial killer na verdadeira acepção da palavra, visto que não está imbuído de vingança ou impulsos emocionais provocados por traumas da sua vida. É completamente despido de emoção quando mata, e quando o faz é arte. Apesar de tudo, pode-se entender que algo se passa com ele emocionalmente porque não consegue relacionar-se com mulheres, acaba por se separar da mulher e não consegue nunca cativar as amantes. Todo o trabalho de estudar as vítimas, os cuidados para não ser relacionado, enfim, o seu trabalho de casa para que o seu trabalho desprovido de ganhos, sim, porque a arte é gratuita, e pinta quadros reais com muito vermelho... enfim... tudo isto não ajuda os relacionamentos, sobretudo o desapegar-se de emoções.

Estando rodeado por morte, afectado pelo terrorismo basco e o clima de opressão política que paira sobre os professores universitários, que obrigados a escolher entre os dois lados, sabendo que a escolha poderia provocar a sua queda profissional, acaba por não ter os cuidados devidos e é acusado de uma morte que não provocou. Não falo mais sobre o enredo deste livro, porque senão retirava-lhe a pitada de descoberta que o leitor deve sempre ter nas suas leituras.

Eu Assassino ataca ferozmente os pseudo-intelectuais, a falsa moralidade e os impostores artísticos. É um livro perturbador, negro (e vermelho) que se lê avidamente em determinados pontos.

A arte de Keko faz lembrar muito Alberto Breccia, do qual deve ser fã. As figuras são um pouco mais gritty que as de Breccia na minha opinião.
Um excelente preto e branco, umas vezes polvilhado de vermelho, outras com autênticos baldes dessa cor. Gostei muito da sequência gráfica deste livro, penso que é um trabalho exemplar de Keko.

O livro em si é uma boa edição da Arte de Autor com um papel de alta gramagem. Imperdível para quem de BD noir a preto e branco

Para a semana terão aqui o Eu, Louco.


Boas leituras

 

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