A minha relação com o Homem-Aranha ficou muito complicada em
2007 com o arco, para mim final, One More Day. Era o meu herói preferido da
Marvel, e decidi encerrar e guardar todas as boas recordações que tinha deste herói desde
miúdo nesta altura. Nunca perdoei à Marvel ter feito isto com o Spider-Man. 🤷🏻
Foi uma personagem que cresceu (literalmente) comigo, mais
devagar, claro, mas foi crescendo, andou no liceu, acabou o liceu, foi
trabalhar, formou-se, casou… enfim, foi dos poucos heróis “normais” que foi
vivendo e envelhecendo, tal como nós. Essa era a magia do Homem-Aranha para
mim, mas há sempre um iluminado que acaba por ter uma ideia de bosta qualquer, e
ninguém tem a coragem de dizer que não. No caso foi um tal de Quesada.
A partir daí só comprei um livro do Spider-Man, foi o Back
in Black que é imediatamente posterior ao evento Civil War e termina
precisamente mesmo antes do One More Day.
Já me tentaram com diversas leituras do Aranha ao longo do
tempo, mas nunca quis ler novamente para não me estragar boas memórias, já nem
é sequer ser uma má ou boa história, ou arco, é simplesmente outro herói
vestido da mesma maneira que o “meu” Aranha.
Tudo isto para dizer que me tentaram novamente com o Aranha,
desta vez com o Ultimate Spider-Man (2024). O universo Ultimate sempre me
atraiu um bocado, porque era um universo alternativo que por norma tinha um
take moderno sobre personagens mais clássicas, e alguns dos livros da Marvel que
mais gostei eram precisamente deste universo, exemplo de topo para mim: The
Ultimates Vol. 1: Super-Human e The Ultimates Vol. 2: Homeland Security.
Foram dois livros que adorei cada página.
Assim sendo, o meu amigo Hugo Silva deixou-me as primeiras
quatro issues desta nova série, e como se passa num universo Ultimate decidi
experimentar, mas como não gosto de fazer reviews de revistas, porque nunca
podemos dizer se são boas ou não, depende sempre da envolvência da história
(daí eu apenas comprar por norma as edições colectadas), resolvi ler online as
duas seguintes para poder ter uma ideia melhor deste 1º arco.
Mas já que estou a escrever, vou encher aqui uns quantos
chouriços com um bocado de história. Ultimate Spider-Man foi a primeira
franquia do universo Ultimate da Marvel. A primeira revista saiu em Setembro de
2000 e num instante se tornou um sucesso. Mark Bagley no desenho e Brian
Michael Bendis na escrita deram corpo no papel a estas novas histórias do
Aranha e a aposta de Bill Gemas (editor) neste Universo tornou-se um sucesso,
apesar dos cepticismos de Joe Quesada (o outro editor), o tal que eu amo por ter
obrigado o arco One More Day a existir.
Ultimate Spider-Man teve existência de 2000 até 2011, sempre
com o argumentista Brian Michael Bendis à frente da franquia. Os desenhadores
foram três: Bagley, Immonen e Lafuente.
A Marvel decidiu no final de 2023, com a conclusão de
Ultimate Invasion e a criação do novo universo Ultimate, recriar novamente o
título Ultimate Spider-Man em 2024 com o argumentista Jonathan Hickman e Marco
Checchetto no desenho.
Em relação a estes dois autores, e começando por Hickman,
este é um argumentista que trabalhou muito na Image Comics, tem uma marca muito
forte na Marvel, já passou por muitos títulos diferentes, tem coisas que gosto
bastante, mas por vezes é bastante lento no desenvolvimento da história e das
personagens. De resto Avengers, The New Avengers, Fantastic Four, vários
títulos Ultimate, e uma passagem por títulos X-Men também, demonstram que este argumentista tem história nesta editora.
Marco Checchetto é um artista que gosto muito, há muitos
anos. Comecei a conhecê-lo e apreciá-lo quando o conheci no Anicomics de 2012
(grandes memórias, certo Mário?). Era o artista em dois títulos com excelentes
críticas: Daredevil – Shadowland e Punisher Vol.1 (2011). A partir daí quando
via o nome de Checchetto na capa de um livro sabia que pelo menos na arte havia
qualidade. Tem trabalhado bastante para a Marvel também ao longo dos anos.
Como características é possuidor de um traço muito bonito, sobretudo ao nível das expressões, a
sua narrativa gráfica é exemplar, com grande clareza e fluidez. Infelizmente
por vezes o argumentista não deixa este homem voar…
Passando finalmente para estas seis revistas.
Então isto começa da seguinte maneira (traduzido do prólogo da revista):
“O Criador Vinte anos atrás, impediu que uma aranha radioactiva
picasse o jovem Peter Parker. Ele também impediu a criação de quaisquer outros
super-heróis e formou um conselho secreto para governar o mundo na sombra.
Quando Tony Stark descobriu a história sombria deste universo, ele procurou
desfazê-la – levando o conselho do Criador a atacar Manhattan, matando milhares
de pessoas, e incriminar Stark por isso. Peter Parker viveu toda a sua vida sem
saber do conselho do Criador ou da verdade por trás da aranha, mas isso está
prestes a mudar...”
Pronto, dados lançados para um universo novo, tipo What if.
Peter é casado com a Mary Jane, tem dois filhos, e o seu tio Ben é vivo e
grande amigalhaço do nosso JJ. A tia May faleceu (inacreditável seja em que
universo for 🤷🏻♂️) no ataque a
Manhattan.
Depois temos um leque que personagens que vão alimentar muito
a trama, como o Kingpin, Bullseye, DareDevil, Gwen Stacy, Octopus, e o grande
Duende Verde. Agora quem é vilão e quem é bonzinho, isso têm que ser vocês a
descobrir 😅
São seis revistas com uma história forte, com boa estrutura,
as personagens são muito bem trabalhadas, sempre tudo com muito pormenor para
dar tridimensionalidade a todas elas.
A estrutura familiar do Peter Parker está muito bem construída,
todos têm a idade correcta de acordo com os pressupostos da história, a
personalidade de todos está muito bem impressa nas suas reacções e expressões
faciais.
Penso que nas próximas seis revistas teremos surpresas
maiores que aquelas que tivemos nestas que lançaram a série. De qualquer modo seria injusto se
dissesse que não tinha sido um pouco surpreendido em duas ou três situações.
Hickman dá-se a um trabalho monstro de em seis revistas “engordar”
seis personagens com toneladas de história, para que sejam credíveis nas suas
acções, tanto no presente como futuramente. Ele construiu estas personagens com
muita filigrana, ao mesmo tempo que as fazia interagir para criar boa dinâmica entre elas.
O negativo disto tudo, de toda esta construção meticulosa de
personagens é a história poder tornar-se chata a espaços. Sim, porque a
narrativa é mesmo bastante lenta por vezes. Tem uma cena, salvo erro na revista
#4, de um encontro entre Peter, Harry, MJ e Gwen, que me fez lembrar as célebres "cabeças falantes" do Bendis… muita
conversa só de cabeças, irra!
Quem queria ver muitas cenas de acção com o Aranhiço, desengane-se, não há
assim tantas, afinal Peter torna-se no Aranha sem experiência, já adulto e pai
de filhos.
E pronto vou finalizar com um buraco visual/narrativo
completamente escusado numa história tão bem estruturada… páh… O
Peter tem uma conversa familiar importante com toda a sua família na última
revista, tipo estamos no pequeno almoço e aparentemente o Sol estava a nascer, e
a mesa tem um set up de pequeno almoço: panquecas e sumo. Quando acaba a
conversa passa a ser de noite e manda-os páh cama?? 😳
Não sei de quem foi a culpa desta confusão, ou foi o Hickman, ou foi o Checchetto.
(Ou foram os dois?)
Já agora, nunca é demais falar na arte de Checchetto, dá uma
excelente atmosfera, as cenas de acção estão muito boas e tem pormenores de expressão nas personagens de excelência. Este artista italiano só pode levar
louvores aqui, e para mais, consegue fazer uma May deliciosa 🤗
Tenho de referir também que na revista #4 e #5 o artista de serviço é David Messina, que não deslustra em nada a série.
E pronto, é uma série stand alone para já, que permite a abertura a qualquer novo leitor, basta ler o prólogo e os dados da história estão lançados.
Obrigado Hugo pelo empréstimo das revistas, quem me conhece
sabe que eu só compro revistas quando por algum motivo me dá uma coisinha menos boa na
cabeça. Ty!
Boas leituras