quarta-feira, 8 de junho de 2022

Solanin



Este foi o primeiro livro que li de Inio Asano, garantidamente não vai ser o último. Reli esta semana este manga slice of life, recorte do quotidiano, e isto era algo que já tinha vontade de fazer há uns tempos. Porquê? Porque embora tenha adorado o livro na altura, apercebi-me que esta obra tinha muito mais a dar-me com uma segunda leitura. E tinha! 

Originalmente publicado Shogakukan em dois volumes no Japão entre 2005 e 2006, foi produzido depois pela editora norte-america Viz Media num só volume em inglês em 2008. Esta é a minha edição. 
Asano, nascido em 1980 , é considerado por muitos como uma das grandes vozes dos jovens adultos japoneses deste século, devido à maneira como trata os temas com que impregna parte das suas obras. Ansiedades, depressões, alegrias, o mundo do trabalho, enfim, tudo o que afecta jovens entre os 20 e os 30 anos no início da sua vida adulta. 

Solanin foi um livro marcante para ele, penso que foi o seu primeiro grande hit, mas logo a seguir inicia a série Goodnight Punpun que se torna um best-seller. 5 anos depois de Solanin torna a criar mais um trabalho notável, Dead Dead Demon's Dededede Destruction
Mas o meu próximo slice of life dele vai ser a sua obra de 2009 A Girl on the Shore (vou tentar deixar um print desta ideia de livro no cérebro de alguém que me o possa oferecer de aniversário aha) 

Se este é um livro com originalidades marcantes? Não! Não é um livro com um final retumbante, não é uma aventura de tirar o fôlego, não é sci-fi, enfim, é um livro chato. Será mesmo? 

Solanin apesar de ser a preto & branco é um livro com muitas cores, um verdadeiro caleidoscópio de sentimentos e introspecções que são contados e mostrados, vividos por um conjunto de jovens que saíram da escola, e entraram naquela vida a que nós chamamos vulgarmente “vida de bosta”. Acabaram-se as loucuras adolescentes, acabaram-se os hobbies, casa para pagar, eu trabalho de dia e tu de noite, o trabalho é uma porcaria sem rosto e sem alma, enfim… a vida é chata. 
Mas podemos mudá-la se para isso houver força, amor e camaradagem! 



Nesta história agridoce as mensagens sobre descoberta e crescimento insinuam-se na maior parte das páginas, a relação entre a liberdade e o aborrecimento (e a morte), a convivência com a memória, memória esta que leva à imortalidade de entes queridos, são assuntos muito bem tratados de uma forma mundana que quase que parecem que nem estão ali. 

A narrativa revolve à volta de uma mão cheia de jovens, Meiko, Taneda, Kato, Rip e Ai. À volta deles temos uma série de personagens que fazem correr a narrativa fluidamente. 
O pontapé de saída é dado por Meiko, que é infeliz no trabalho e resolve despedir-se. Tem dinheiro para se sustentar durante uns tempos e resolve experimentar a liberdade de fazer apenas o que lhe apetece.

Taneda é o namorado que vive com ela, têm uma relação de seis anos. A situação de Meiko acaba por fazer esticar algumas vertentes da sua relação, relação esta que influi directamente na vida dos restantes amigos. Taneda era guitarrista e vocalista numa banda com os restantes companheiros, a banda Rotti. A situação da banda é importante porque Taneda acaba por se despedir também para seguir o seu sonho de viver da música. 

Com estas premissas Asano constrói e desconstrói a vida destes rapazes, não vou contar mais nada do que se passa no enredo, porque seria impossível evitar spoilers daqui para a frente. 

Asano narra a história mais vulgar que existe, mas esta narrativa gráfica é primorosa, tem impacto no leitor e não o deixa indiferente. Seja nos pormenores humorísticos (poucos) que são deliciosos, seja nas reflexões das personagens que podíamos ser nós. 

Essa é talvez a grande força deste livro, nós conseguimos identificarmo-nos em muitas situações, e elas são-nos descritas de modo a que ficamos presos à vinheta, à página, ao livro. E não nos podemos abstrair que este livro é um retrato também, uma fotografia de uma sociedade mais restritiva que a nossa, mas onde existe luta e inconformismo. A canção Solanin tem muito disso. E no final... a banda era mesmo isso, um grito de liberdade, uma corrente de camaradagem entre eles.

A primeira parte do livro é lenta, por vezes a roçar o chato. Mas é premeditado, a vida deles era isso mesmo: aborrecida e chata. Mas tudo muda depois, sim depois voltamos ao assunto de fazer perdurar a memória de quem gostamos ou amamos. Inicialmente tivemos o velhote com Alzheimer que apesar disso escreveu durante anos para a sua mulher falecida, na segunda parte voltamos pungentemente a esse assunto. Memória e imortalidade. 

A arte de Asano é excelente, a maneira como ele flui entre vinhetas e páginas cativa a visão do leitor, fazendo-a acelerar ou parar onde este artista decide que o leitor o deve fazer. Muitas vezes quando a personagem está em reflexão, Asano opta por fazer menos vinhetas na página e deixa um espaço negro entre elas, onde coloca o pensamento da personagem em dois ou três grupos de reflexão, obrigando o leitor a ler e não passar na diagonal. 
Esta saída gráfica é bastante inteligente e eu gostei. 



A forma de representação gráfica das personagens define um certo estilo ao longo do livro, por norma a face é larga com os olhos afastados e amendoados com sobrancelhas pequenas e altas, e o nariz pequeno e largo, dando muito espaço para a boca. Esta relação que existe sobretudo entre os olhos e a boca é onde Asano promove a maior parte das expressões, e devido a este espaço olhos/nariz ser basto funciona muito bem. 

Este Manga tornou-se de culto, passado pouco tempo teve direito a filme live action de sucesso no Japão, a música Solanin foi criada pelos Asian Kung-Fu Generation (com a letra deste livro, de Inio Asano) e esteve no top 3 japonês durante uns tempos. 
De notar que no filme a música é tocada pela banda do livro, os Rotti, e cantada pela actriz Aoi Miyazaki que personifica Meiko





Ficam aqui com as duas versões desta música, o trailer do filme contém spoilers importantes por isso não é incluído neste post  😊 



Um excelente livro que aconselho a toda gente. 



 Boas leituras

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