Temos mais uma crónica temática escrita pelo Paulo Costa!
São sempre bons e divertidos momentos dentro deste blogue, e já já já a terceira só para vocês, leitores do LBD!
:D
Reflexões e Refracções III: Bangalla, o Reino do Fantasma
De volta com mais um olhar num tema específico dentro de uma história de banda desenhada. Desta vez, passamos para o Fantasma, criado pelo cartunista Lee Falk em 1936 e ainda hoje publicado, 13 anos depois da morte do seu criador. O Fantasma é dos últimos heróis colonialistas ainda em actividade, numa era em que o conceito do herói branco que vem da civilização para salvar os ‘nativos’ na própria terra destes não é apenas ofensivo, é mesmo racista. No entanto, aqui ainda parece funcionar.
Ambientada no país fictício de Bangalla, que no início da história ficava algures na Índia, a história do Fantasma logo se estabeleceu em África. Como é costume nos países que só existem em histórias, não se sabe exactamente qual é a extensão de Bangalla, sendo que qualquer pessoa com um conhecimento mínimo de geopolítica sabe que é impossível colocar estes países num mapa sem roubar espaço a outros. Geralmente, estes países são micronações, mas a quantidade de selva inexplorada dá a ideia que Bangalla tem uma extensão considerável.
Bangalla é uma democracia independente mas há vários anos que é governada pelo mesmo presidente, o ex-médico Lamanda Luaga. Pior, o regime de Luaga não parece ter muito poder além da capital Mawitaan, única metrópole e único local com civilização europeia do país.
A maioria de Bangalla é composta por selva habitada por tribos que continuam a viver de acordo com as tradições pré-colonialistas, com acesso limitado a tecnologia. Durante séculos, foram protegidos de esclavagistas e potências colonizadoras pelo Fantasma (e pela sua organização paralimitar independente, a Patrulha da Selva), pelo que poderão não sentir necessidade.
Seja como for, o acesso à capital parece garantido, já que o presidente Luaga e o seu inimigo, o general Bababu, são Llongo, e o filho do chefe Wambutto dos Wambesi já foi estudante universitário. Apesar da sua tribo não ter sido revelada, o coronel Worobu, chefe da Patrulha da Selva, parece ser Wambesi. Os Llongo e os Wambesi, as duas tribos mais poderosas e que aparecem com alguma regularidade, praticam a pastorícia e agricultura com algum sucesso, enquanto os Mori são pescadores. Os pigmeus Bandar são uma anomalia, já que a sua função é proteger a lenda do Fantasma. Inicialmente, eram conhecidos como canibais, depois pelas suas flechas envenenadas, mas agora parecem bastante mais amigáveis.
Se as tribos locais podem dar-se ao luxo de escolher ficar longe dos avanços tecnológicos da civilização (sem falar dos aspectos sociais, se bem que a maioria das tribos corresponde ao cliché do ‘selvagem nobre’), o mesmo não se pode dizer das várias micronações independentes que existem nas montanhas.
Muitas vivem isoladas da civilização. Apesar do seu pequeno tamanho, muitas são habitadas por populações de origem europeia e existem num nível tecnológico e social situado algures entre a era medieval e a Revolução Industrial. Mesmo que a presença do Fantasma tenha impedido uma colonização prejudicial às tribos nativas, seria quase impossível estes pequenos reinos permanecerem ignorantes dos avanços mundiais. Mesmo as cidades-estado mais avançadas, como a Baronkhan liderada por Rex King, o filho adoptivo do Fantasma, deveriam ter exigido algum degrau de autonomia ou participação na governação após a Partilha de África na Conferência de Berlim de 1884, quanto mais após o processo de descolonização. No entanto, mesmo quando aparecem em histórias actuais, têm leis próprias e funcionam de modo independente de Bangalla, com quase nenhum contacto com as populações locais ou com os seus antepassados europeus. Nunca foi explicado como estes países foram lá parar e como continuaram a ter populações exclusivamente caucasianas.
Passar tempo a explicar o processo político de Bangalla retiraria espaço às aventuras do Fantasma, mas responderia a muitas perguntas que existem sobre os vários anacronismos que permanecem vivos numa nação moderna, mesmo quando está localizada no continente africano.
Texto: Paulo Costa
Espero que se tenham divertido e pensado um pouco com este texto do Paulo. Se clicarem no nome dele ficam com acesso a todos os posts que le já fez aqui no Leituras de BD.
E presumo que isto não vá ficar por aqui... até eu já estou a ficar entusiasmado em fazer uma Crónica Temática!
Ficam mais umas imagens desta mítica personagem criada por Lee Falk.
Boas leituras!
Era fã das revistas da RGE com o Fantasma, mas nem tanto das tiras que vinham no correio da manhã lol
ResponderEliminarQuando o Fantasma caminha pela selva até os tigres perdem as riscas-velho ditado da selva!
ResponderEliminarOM
Sendo um enorme admirador do trabalho de Falk, seja no Phantom ou em Mandrake, não posso deixar de comentar. A minha mãe é, ainda hoje, uma incondicional fã deste autor e dos seus personagens, comprando tudo o que era publicado nos idos anos 70 e 80, fosse RGE, fosse APR, fosse o que fosse, e compartilhava comigo essas revistas de BD, acabando eu por ficar com elas na minha colecção. É curioso, mas estes personagens são de um romantismo incontornável, pelo que não me admiro que a minha mãe gostasse deles (ou outra mulher qualquer). São galãs de outros tempos: levantavam-se quando uma senhora entrava numa sala, não usavam termos ofensivos e eram cuidadosos com a imagem que transmitiam, fosse na indumentária fosse nas maneiras e pensamentos, ao mesmo tempo que cultivavam uma aura de mistério. Enquanto rapazola, miúdo, eu gostava mesmo era das aventuras, do castigo aos "maus", das cenas de "pêra", do Diabo (o lobo do Fantasma), do pigmeu Guran com os dentes serrilhados, e da bela Diana Palmer, funcionária das Nações Unidas, namorada do herói e depois sua esposa (sabiam que o Mandrake esteve no casamento como convidado?). Mas as maneiras, as boas maneiras transmitidas por Falk, um cavalheiro, também foram absorvidas e ficaram. Ainda hoje gosto de reler todas as aventuras do Fantasma, o Duende que Caminha, do Mr.Walker. Ao contrário do Hugo Silva, as tiras do Correio da Manhã (antes no A Capital) eram devoradas e recortadas para serem coladas num álbum para depois as reler com melhor continuidade; tiras desenhadas por gigantes como Carmine Infantino e Bill Lignante e, finalmente, por Sy Barry, sempre seguindo o argumento do grande sr. Falk (infelizmente perdidas numa qualquer mudança de casa!).
ResponderEliminarEste mítico personagem até dos leitores reservou a sua face, apenas a família e os amigos mais chegados ao personagem é que a conhecem, os leitores ou o veem com o fato do Fantasma, ou com a sua gabardina, chapéu e óculos-escuros. Há uma história em que o Fantasma vai para o mundo real "ver o que a vida custa", em virtude do seu envolvimento amoroso com Diana, mesmo aí os óculos-escuros escondem-lhe os olhos enquanto cava valas.
A História que o autor criou para dar consistência ao herói é extremamente rica e minuciosa, mas mesmo assim, devido aos inúmeros escritores que o personagem foi tendo ao longo das décadas, existem alguns anacronismos. Mesmo com Falk esses anacronismos são bastante visíveis, em especial no que concerne à Geografia.
O plano que o Paulo escolheu para abordar o Fantasma é bastante interessante, fruto de uma época, mas que evoluiu e nem sempre positivamente, mas sem dúvida, conforme o Paulo escreve, com uma estranha aceitação por todos num mundo cada vez mais preocupado com o politicamente-correcto, talvez neste caso paradoxal as pessoas descarreguem o seu falso pudor e assumam a hipocrisia.
Parabéns por este post.
Adoro esse personagem, muito boa a surpresa.
ResponderEliminarHá muitos anos, li o livro (não BD) com a história do Fantasma, sobretudo, com os seus primeiros anos, escrito pelo próprio Lee Falk e (espantoso!!) traduzido para português e editado cá nesta terrinha.
ResponderEliminar(http://en.wikipedia.org/wiki/The_Story_of_the_Phantom:_The_Ghost_Who_Walks)
Tenho imensa pena de o ter perdido.
Mas o que é interessante neste meu post, é que em termos de BD, este nunca foi uma personagem que me interessasse muito. Fiquei muitissimo mais interessado na novela que referi do que nas BD propriamente ditas.
Gosto muito de ver o entusiasmo pelo Fantasma, personagem hoje em dia esquecido ou maltratado. Costumo acompanhar as tiras novas no site do jornal Seattle P.I., mas perdeu-se algum do romantismo e do sentido de aventura de anteriormente, ao qual não será estranha a pouco dinâmica arte de Paul Ryan.
ResponderEliminarJá pensei em comprar as colecções de material antigo lançadas recentemente, mas embora as primeiras histórias sejam boas, tenho bastante dificuldade em gostar do material de Wilson McCoy. Sy Barry é para mim o artista definitivo do Fantasma, que transformou Bangalla numa terra tridimensional, e que soube inspirar Lee Falk a modernizar a história sem perder contacto com a magia, o misticismo, a aventura e a fronteira entre o real e o imaginário que eram comuns na história do Fantasma.
Li muitas histórias do Fantasma, em especial no Mundo de Aventuras e era sem dúvida um dos clássicos norte-americanos que eu preferia.
ResponderEliminarA título de curiosidade, fica a referência à passagem do Eliseu Gouveia (Zeu), pelo título, há meia dúzia de anos.
Excelente lembrança esta. Foi das primeiras personagens que li e segui. Sempre que os meus pais me davam algum dinheiro lá ia eu à papelaria procurar por um livro do fantasma. Do Mandrake havia menos, mas também arranjei alguns.
ResponderEliminarMíticas personagens sem dúvida. E lembro-me de os ver juntos nos desenhos animados "defenders of the earth".
Abraço
Texto maravilhoso, o Fantasma é um personagem muito intrigante!
ResponderEliminarÈ verdade...O Zeu andou pelo Fantasma. Mais um excelente artigo do Paulo.
ResponderEliminarInfelizmente, fantasma só tenho um nº (creio que da APR). Assim como do Mandrake.
Há todo um mistério à volta destas personagens, não há?
Grande abraço ao Paulo pelo artigo e ao Nuno pela disponibilização deste espaço.
Texto bacana, pois da forma com que foi redigido ajuda o fã do Fantasma a conhecer melhor o contexto do personagem.
ResponderEliminarHugo Silva
ResponderEliminarBem... as tiras eu não via porque o meu pai não comprava esse jornal!
:D
OM
Gostava do respeito que todos tinham ao Fantasma ali naquele cantinho da selva...!
:)
Refem
Obrigado pela boa colaboração!
Também tenho como certo que aqule romantismo e galantaria, com murros a ficaram bem marcados na cara dos bandidos, foi um belo tempo que passou, infelizmente agora essa magia passou completamente de moda.
Eu adorava o Fantasma... Sobretudo aquelas histórias com antepassados!
;)
Venerável Victor
ResponderEliminarSomos dois!
:)
pco69
Nunca li a novela, embora tenha ouvido falar muito bem dela. Lee Falk criou dois excelentes personagens, este e o Mandrake.
Gostaria de ler a novela, mas penso que isso já não existe em português...
:\
Pedro Cleto
Também foi no Mundo de Aventuras que li a maior parte deleas!
(Temos a mesma idade... LOL)
:D
Guy Santos
ResponderEliminarFaz parte da magia dessa personagem o mistério! Nunca se vê a cara dele, por exemplo!
;)
João Figueiredo
Muito mistério sim! Foi assim que Lee Falk criou toda aquela magia à volta do "Duende que caminha".
Não sabia que o Zeu tinha desenhado o Fantasma!
Também só tenho um neste momento... infelizmente! (Tive tantos...)
:(
João Figueiredo
Os textos do paulo são sempre muito fixes!
;)
"Míticas personagens sem dúvida. E lembro-me de os ver juntos nos desenhos animados "defenders of the earth"."
ResponderEliminarEu tambem,a Solo só vi no fime e no desenho animado Fantasma 2020 com um herdeiro do legado dele bds nunca li nenhuma.
Optimus
ResponderEliminarVi o filme, mas não me lembro de nada... (acho que felizmente...), apenas seguia a BD que gostava muito! Era dos meus preferidos no Mundo de Aventuras.
:P
O filme não é mau, mas não é grande coisa. Diverte naquelas tardes de domingo em que não tens nada para fazer. De vez em quando é repetido na SIC ou no Hollywood.
ResponderEliminarÉ um pouco baseado nas primeiras histórias, tanto que a ação passa-se na Índia, os inimigos são a Irmandade Singh (mais um vilão inventado) e o Kit Walker é meio playboy - originalmente, o Fantasma era para ser um galã ricaço chamado Jimmy Wells.
Paulo Costa
ResponderEliminarLembro-me que era um filme pipoca.
Nada de especial, mas dava para entreter!
:D